A rua era larga. Uma pequena-avenida e, àquela hora, muitas pessoas passavam por ali. O comércio em frente ao prédio era um restaurante daqueles fast-food-comida-caseira.
Ela apareceu, dobrando a esquina, de mãos vazias, procurando o que fazer. Entediada. Subiu os seis degraus lentamente, apoiando-se no corrimão, escorregando no piso molhado pela chuva. Andou até a porta, colocou a chave na fechadura, mas não a girou.
A pequena flor recém-desprendida do arbusto perto da porta chamou sua atenção – era uma daquelas amarelas, com bordas marrons. Pensou em levar a flor até os cabelos. Poderia fazê-la viver algumas horas a mais. Se ficasse ali, no chão frio, provavelmente seria esmagada por algum condômino apressado, que poderia pisar numa flor assim como pisaria numa casca de banana.
Enquanto pensava, deixou-se cair no chão, em frente à porta, olhando atentamente a flor. Ainda não tinha perdido o brilho das flores jovens, vivas; as pétalas estavam geladas, orvalhadas, e pareciam resistentes como se parecem as pétalas das tulipas. O caule estava verde e espinhento, de modo que a idéia de colocar a flor nos cabelos foi descartada.
Colocou a bolsa no chão e passou a examinar a flor com mais entusiasmo, com ambas as mãos. Pensou que, se tivesse uma lapela, iria ser divertido pousá-la ali – especialmente se fosse um casaco verde. Riu-se da idéia – quase gargalhou, olhando para o céu.
A nuvem estava escura. Eram quatro da tarde, e o dia parecia ter pelo menos quatro horas a mais. Abriu um pequeno buraco na terra ao seu lado, plantou a flor no melhor estilo ‘a dama e o vagabundo’. Encolheu as pernas, segurando ambas com os braços quase cruzados – olhou para cima. O sol e as nuvens carregadas deixavam o céu com um aspecto diferente. Passou alguns minutos observando e, quando baixou novamente os olhos, despertada pelo barulho do molho de chaves na porta, a primeira lágrima foi manchar sua blusa vermelha.
Olhou para a rua. A visão que teve a surpreendeu. A alguns metros, escada abaixo, havia dezenas de pessoas, tanto em pé quanto sentadas na calçada. Todas olhavam atentamente para ela, como se fossem uma pequena e fiel platéia, à espera do próximo gesto de um artista.
Ela escondeu o rosto, limpando as lágrimas na manga da blusa, sem saber ao certo de onde haviam aparecido. Levantou-se, girou a chave da porta e desapareceu edifício adentro.
TS