Veja o outro lado

Veja o outro lado (foto por Joe Fox)

Estava sozinha no quarto, agarrada ao travesseiro. O telefone estava próximo, sobre o criado-mudo, em alguns poucos gestos poderia conversar com o pai. Respirou fundo, aprontou-se para pegá-lo, mas hesitou.

As mãos ficaram frias e seguraram firmemente o travesseiro preso ao peito. Pensou por um instante, olhou para a boneca preferida sentada na cadeira na frente da cama. O escuro do quarto e a luz fraca da noite vinda da janela davam a ela a silhueta de um monstro, mas os olhos da boneca brilhavam e a garota sorriu.

Pegou o telefone. Largou o travesseiro no chão, colocou o aparelho no colo e discou lentamente. Mordeu os lábios, receosa, e a linha chamou. Uma, duas, três vezes. Uma voz feminina e dura atendeu, incomodada.

– Alô!!

A garota colocou violentamente o fone de volta no aparelho e sem querer jogou o aparelho no chão, como se este tivesse queimado sua mão. Os olhos se encheram de lágrimas, uma delas escapou e manchou seu rosto. Agarrou novamente o travesseiro e abraçou-o com força.

Era Natal. Uma festa sem graça agitava a casa, música alta, comida e bebida, mas o andar de cima estava escuro e quieto. Ouvia-se uma música natalina em algum lugar. Se ela olhasse pela janela, talvez pudesse ver até algum Papai Noel fajuto batendo na porta de alguém para poder entregar os presentes de um jeito mais seguro.

Olhou para o telefone e discou de novo. Pediu baixinho que a mulher não atendesse novamente a chamada. Duas chamadas e uma voz masculina e suave se fez ouvir. O conforto daquela voz a invadiu e seu coração começou a bater rápido. Teve a sensação de que a luz do quarto se acendeu e uma música bonita começou a tocar, ali dentro.

A voz do outro lado ficou sem entender porque de repente a pessoa que lhe havia ligado tinha começado a chorar. Feliz.

(Foto por Joe Fox)

TS


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