estava sentada no sofá da sala escura, há dias a tv pousava sua luz azul sobre ela. as janelas estavam fechadas, um frio congelante dentro do pequeno apartamento, sopros de vento invadindo janelas abertas em outros cômodos e a sensação de não estar completamente sozinha.
o telefone havia tocado nove vezes. ele ia catando as roupas pelo chão, pequenos objetos que ninguém sabia ao certo se eram dele realmente, mas não importava. foi colocando tudo em uma mala preta, peça por peça, ao som da única fonte de ruído naquela sala gelada.
ela não se movia, acompanhou-o com os olhos por toda a sala, ouvindo o telefone tocar. largada no sofá, o rosto sobre a mão, cotovelo sobre o braço do sofá, assistindo tudo como a um filme de má qualidade. tentava parecer indiferente. o personagem, de qualquer forma, não expressava nenhuma reação que pudesse emocioná-la, era apenas alguém pegando suas coisas do chão e colocando-as dentro de uma mala preta, de modo que ela conseguiu manter essa farsa com êxito.
não havia lágrimas, gritos, súplicas.
olhou para a janela por um instante, sem deixar o sofá. o frio estava chegando a um limite insuportável. ela se encolheu, colocou as pernas junto ao corpo e fitou a janela. a impressão era de que lá fora estava nevando, uma neve pesada, tempestade de neve branca cortando a noite escura. era o que mais emocionava a garota no momento.
por fim, ele havia sumido porta fora, apenas, levando malas e pertences para um pequeno caminhão, indo embora para sempre, sem dizer nada.
encolheu-se na poltrona grande, aquela que os dois costumavam repartir. não tinha certeza se havia alguma importância, de fato, na situação. ele foi. ele se foi, após dois anos de convivência. não disse nada, juntou as coisas, afagou a cabeça do gato e saiu. a casa é mais vazia, mais gelada, fechada, mas o sofá e o gato vira-lata a aquecem.
mudou de canal.
“você não liga pra mim! tá fora desse mundo e só pensa nesse gato!”
[blam.]
(foto por SHYCITYNikon)
TS