Júpiter

Júpiter

Não há nada ali.

– Você tem que levantar daí pra ver. Anda! Vai lá ver!

Tem alguém caindo pela janela.

– Onde? É do andar de baixo. Visão perfeita. Ela tentou agarrar o ar, e ele a segurou por um momento.

Não vi quando ela escapou. Alguém deve tê-la empurrado.

– Ninguém a empurrou. Ela pulou. Pulou.

Ela não pulou. Ela caiu. Eu vi aquele choque no olhar dela. E medo.

Decepção. Procurou alguma coisa diferente. Alguma coisa que ela pudesse ver e tocar.

É como aquele último pedaço de bolo. Pedaços de bolos mostram como as famílias são. O último pedaço de bolo pode ser repartido. Ou alguém pode pegá-lo na calada da noite para não ter que dividir com ninguém. Ou mesmo brigar a tapas por ele. Podem abrir mão dele, oferecendo-o para outro alguém e privando-se do prazer de devorar o último pedaço de bolo, só pra ver alguém que gosta mais feliz.

– Eu vi ela pular. Não é questão de entender ou imaginar ou supor. Ponto.

Quero que alguém escute. Acredite. Aqueles prédios ali, eles parecem de borracha. Eu vejo o vento, e ele parece balançar os prédios, quer derrubá-los. Mas eu não quero dizer exatamente isso.

– Está fora. Adeus. Ninguém pode vir aqui. Vá embora. Vire-se para trás e desapareça. Olha a pedra! Bem feito.

Quem poderia imaginar. Não foi um simples por quê. Uma pergunta para uma simples resposta ou algo do gênero. Mas ela fez o que fez. Sim, ela guardou tudo que era dela lá dentro. Mas a chave está garganta abaixo. Vai ter que arrombar a porta, porque ela se trancou sozinha. Ela está lá, e tem um alguém com ela. Presa com todas aquelas coisas rodando no quarto, fazendo um círculo ao redor dela e a encurralando na parede da direita, a parede menor.

– Ouve os ruídos? Ouça! São tantos e fazem um som tão afinado.

Não é nada, nada. Ruídos querendo ser uma canção. É tudo o que um ruído deseja. Que o elogiem, o achem belo. Mas ruídos cortam os ouvidos. Irritam os martelos e um gesto em comum. Duas mãos espalmadas rodeando a cabeça, quando na verdade o ouvido tenta captar o som para que possa conhecer e diferenciar o ruído da música. Algum som sempre escapa. O cérebro agradece.

Isso assusta. Ela pode pegar um livro, um lápis. Pode tentar correr, pular a janela. Ser alguém que ela nunca foi, imaginar alguém que ela nunca conheceu e pode se perder para sempre. Pode quebrar as pernas, pode cair sobre as espadas e cortar o braço. Pode se encolher no chão e não conseguir se levantar. Alguém pode segurar o grito, a chave caiu no chão.

– Stop Dead, stop dead.

Não tem ninguém aqui. Um lugar vazio, um grito vai ecoar, e permanecer ecoando até ficar perdido pelo espaço. E então um pato a invejaria, se ele soubesse andar na neve.

Está a trezentos quilômetros daqui. Ela está ouvindo o que está sendo dito, o tempo todo, em todos os lugares. É um ser simples e ordinário fingindo ser onipresente. Fingindo ter superpoderes, fingindo que sabe fazer tudo que imagina querer fazer.

Finge estar em outro lugar e perde a respiração à medida que olha para parede, a parede, a parede… Tem que segurar para não cair, porque as pernas são sempre incapazes de manter o corpo ereto. A gravidade se torna mais forte enquanto alguém mantém uma força para o chão, força mais intensa que a força que duas pernas possuem.

– Ninguém disse que teria que abrir os olhos. Está provocando sentimentos. Tem o desenho de uma rosa pintada ali na parede, uma rosa azul. Ela tem aqueles, sabe, espinhos, rodeando o caule, e algumas mãos tentam sempre pegá-lo sem se espetar nos espinhos. Mas ninguém consegue, é sempre em vão. Eu sempre sei.

A rosa é uma armadilha. Ela quer que a peguem, quer que uma cena romântica se desenlvolva ali, a partir daquele momento, cheio de palavras enfeitadas e sorrisos que parecem inofensivos mas que olham gritando. Mas eu não estou mais aqui. Eu estou em Júpiter. Estou perdendo o fôlego em Júpiter.

Perdendo o fôlego em Júpiter.

TS


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