como se fossem ilusões numa cachoeira em névoa, minhas mãos sobre o concreto acinzentado, inventando o que sentir, quando o cansaço trêmulo murmura palavras que não posso entender – fosse chinês, eu digo, pois então seria passível de explicação segura – letras brancas passeando numa sala de espera vazia, o ventilador dançando sobre as cadeiras enfileiradas atrás do balcão – finge hesitar, preso a um pedaço enferrujado de corrente. senhorita coisa alguma sente-se apática e descansa sobre uma mesa-creme, encarando-se – contando-me histórias. ‘eu odeio histórias’, digo, mas ela se levanta e me encara, espetando com os olhos, como se minha observação a tivesse profundamente ofendido – segura-me pelos braços, faz menção de querer me chacoalhar, em revolta. sem razão, sua expressão se transforma, e ela apenas me fita com ironia e um sorriso nos lábios, esconde-se atrás das cortinas, afasta da poeira um quadro emoldurado em vidro pintado de azul. sinto o cheiro adocicado da época em que os arco-íris apareciam coloridos em dias preto-e-branco e não posso deixar de sentir meus lábios reagindo, ligeiros, e meus olhos curvam-se para a mesma direção. ela me entrega uma fita amarela e um quadro com molduras pálidas, ferido com letras avermelhadas, escorregando pela tela. sentindo-me deslocada, espio o quadro e compreendo, enquanto ela grita ‘tola! com todas as cores que você tem nas mãos!’
ela sabe que não tem que me fazer sorrir.
TS