Ignorância

Ignorância

Não sei predicar meu coração. Fazer com que os olhos fechados acendam-se em uma aurora de vida, jamais entregues, no terror que experimentam dentro de um corpo trancado, perdido dentro da mente, olhos expressando equívocos e encarando sem compreender, e sentindo-se com a obrigação dessa percepção ao menos intuitiva, se não racional, pois são a linha que separa o interior do mundo externo. Em uma época que caminhar sozinho é um fator determinante do alcançar ou não, eu quero me dispor a fazer mais essa experiência, agora de próprio punho; quando, em tantos anos, o inconsciente dessa ação – sem nunca deixar de perceber a minha culpa – fez-me padecer.

Agora eu quero acreditar que a natureza é páreo para toda a minha incerteza, para a minha ignorância. Agora quero que os pedidos sejam feitos com palavras claras; e as palavras, essas não serão mais instrumento de dor ou de amor. Não trarão mais consolo nas noites de angústia, tampouco farão rir. Não será mais usada a pilha de papéis em branco, que transforma armários em guardiões de fantasmas, cujas folhas onde ensaiei histórias mancham com os esforços frustrados de tentativas aflitivas de perdão, à mim mesma, marcadas de um sentimento que machuca o coração, como uma flecha em brasa que, todos os dias, deixa uma ferida simbolizando tudo que há muito tento deixar para trás, deixando cicatriz sobre cicatriz, fazendo-me reconhecer em pleno desespero a esperança esvaindo-se, mudando seu trajeto para longe, fazendo-se silenciosa, onde as palavras mal foram escritas.

Não vou mais desacreditar dos momentos em que os olhos molhados perdem a calma, clamam, e preenchem meus devaneios de questões impossíveis de serem resolvidas, como se as contas de matemática não tivessem mais soluções, como se todos os gênios de cálculo tivessem, num repente, desaparecido da face da Terra, ou simplesmente desistido de fazer o que faziam de melhor porque não fazer exige menos esforço frente à todas as facetas da vida, todos os trabalhos, todos os assuntos, todo o cansaço, todas as relações construídas, incertas, de medo e de afeição.

Dessa forma, não faço suprema a tranqüilidade do acordar. Como foi em certos dias em que o respirar frenético ao meu lado, ao mesmo tempo em paz, despertou-me. Ao contrário, faço inferno. Porém, a conclusão que surgiu num instante em que o silêncio calava os murmúrios – que tentavam fingir-se palavras – é que, se a condição é existir em pesadelo e a esperança bateu a porta na minha frente, que agora eu proíba meus personagens de me levarem para onde eu me sinto alguém, pois viver apenas a minha realidade já não me basta.

TS


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